terça-feira, 12 de dezembro de 2017

VETERINÁRIOS APÍCOLAS - ONDE ANDAM?

Como é sabido, a base e estabilidade produtiva de qualquer sector pecuário é o bom estado sanitário dos animais. Como tal e como em qualquer sector, existem pessoas formadas para exercer determinadas funções e neste caso, no sector pecuário temos os veterinários.

Não me querendo muito alongar sobre a formação base dos veterinários em Portugal, da mesma forma que existem veterinários que tratam e cuidam de porcos, vacas, ovelhas, cães, gatos, periquitos, etc, etc, seria de esperar que tivéssemos também veterinários apícolas, pois as abelhas também fazem parte do reino animal.

Julgo não estar errado, mas desconheço que exista um único veterinário apícola em Portugal, individuo que se especializou em sanidade apícola e exerça essa profissão.


Em vez disso, temos dezenas de Eng. Agrónomos, florestais, zootécnicos, etc, etc, que no fundo substituem aquela que a meu ver é uma função exclusiva de um Veterinário, pois até ao momento ainda não vi que seja aceite que um Eng. Florestal faça consultas, passe receitas de medicamentos, etc, nos outros sectores pecuários. Trata-se de uma exigência legal.

Sendo a minha base "Eng. Agro-Florestal", tendo-me dedicado em exclusivo à apicultura, sinto-me à vontade para discutir esta situação, pois, na grande maioria já sei que tipo de comentários irão surgir, especialmente de quem representa as diversas associações de apicultores. "Que temos excelentes técnicos apícolas, excelentes profissionais, etc, etc." ... e que não é por ter formação base de veterinária que as coisas seriam diferentes..."

Tudo bem, é discutível, contudo, não é de todo aceitável ir ao médico e ser atendido por um Eng. Agrónomo, é para isso que existem cursos superiores nas diversas áreas.

E eu pergunto, já ouviram alguma vez na vossa vida um veterinário apícola falar sobre abelhas? Eu já, e fiquei completamente impressionado, pois está focado em sanidade, sanidade, sanidade. 

Mas quando falo veterinário apícola, falo de alguém com experiência diária de campo, que está ao lado dos apicultores, alguém que os acompanha e conhece como ninguém a realidade e os ajuda da melhor forma. Tive a oportunidade de ouvir durante uma palestra um veterinário espanhol, e garanto-vos que dificilmente um técnico de ciências agrárias consegue atingir esse nível.

Não quero com este artigo, passar nenhum atestado de inutilidade aos técnicos apícolas existentes no momento, quero sim fazer entender que seguimos erradamente um caminho, pois o facto de termos excluído veterinários do sector apícola, não sendo uma obrigação legal tal como acontece com os outros sectores  pecuários, provocamos uma desvalorização do animal que mantemos "a abelha" ao permitir que qualquer um esteja habilitado para exercer funções ao nível sanitário.

Considerando-me um técnico apícola com formação base nas ciências agrárias, por natureza temos vários focos, que desviam a atenção para factores produtivos, de maneio, flora apícola, etc, etc, onde junto com estes factores incluímos também a sanidade apícola. Somos pessoas polivalentes que somos obrigadas a saber de tudo um pouco e nunca conseguimos concentrar-nos num único tema, pois assim somos obrigados.

Ao contrário, um veterinário apícola, o seu foco principal são as questões sanitárias, havendo especializações a vários níveis.

Existe espaço para todos, especialmente zootécnicos a trabalhar junto com veterinários, mas no caso de sermos obrigados a optar por uma especialização, é de todo geral a opinião que a sanidade é prioritária.

Com a quantidade de informação existente ao nível produtivo, flora apícola, maneio, etc, etc, que existe nos dias de hoje, faz cada vez mais sentido, começarmos a trabalhar de forma a termos veterinários apícola especializados a sanidade apícola, pois como sabemos, com todos os problemas já existentes no maneio de abelhas, junto com as alterações climáticas, resta-nos trabalhar no sentido de ter um apoio sanitário ao mais alto nível, pois será a base primordial para continuar a manter abelhas vivas e em produção.

Este é um tema novo que irei promover até que surta resultados, pois faz todo o sentido trabalhar para entregar "o seu a seu dono", e neste caso, a sanidade apícola a veterinários apícolas.


João Tomé
...um apicultor, pela apicultura...

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

A APICULTURA E OS INCÊNDIOS FLORESTAIS

O ano de 2017 ficará marcado para sempre como o pior ano da história de Portugal ao nível do número de colmeias perdidas e pastagem para as abelhas que foi consumida pelo fogo, tendo havido inclusive a morte de apicultores a salvar colmeias.

Foto: António Gaspar
As alterações climáticas são reais e têm dado provas disso, sendo os apicultores os primeiros a senti-las, pois trabalham com insectos que reagem a factores ambientais que passam desapercebidos ao Homem, sendo cada vez mais difícil manter as abelhas vivas.

Os anos são cada vez mais instáveis ao nível meteorológico, afectando directamente as florações e estabilidade das colónias de abelhas, onde, ao contrário de antigamente, em vez de termos maus anos de produção pontualmente, começamos a ter maus anos regularmente.

Junto com todos os problemas directos e indirectos das alterações climáticas, temos o aumento do número de incêndios florestais de grande dimensão (acima de 100 hectares), incêndios que provocam a perca total de pastagem para as abelhas, reduzindo a diversidade floral se os mesmos tiverem uma elevada recorrência (período de tempo que voltará a mesma área a ser consumida pelo fogo).

Foto: Afonso Correia
Da mesma forma que a perca de pastagem sucessiva provocada pelos incêndios não é benéfica para as abelhas, o envelhecimento das áreas de pastagem também não é favorável à manutenção e equilíbrio das colónias.

Não sendo económica e ecologicamente possível manter as abelhas vivas com recurso a alimentação artificial, é tempo de nós apicultores passarmos a ter uma postura interventiva na gestão do território.
Não podemos continuar a ser meros utilizadores do território, passando desapercebidos a tudo e todos.

Além de um esforço em aprender a lidar com os incêndios, minimizando o risco das colmeias arderem, limpando uma faixa de pelo menos 10 a 20 metros em redor das colmeias (dependendo do tipo de vegetação, altura e carga combustível da mesma), havendo mesmo assim alguns casos mais extremos que temos mesmo de lavrar a terra em redor, temos também de nos expor e impor perante a sociedade.

Para isso, será importante no futuro, os apicultores fazerem parte dos grupos de trabalho com intervenção directa no território, apresentando propostas de gestão em complemento das que são apresentadas por outros sectores (ex. exploração florestal, conservação da natureza, etc.), favorecendo desta maneira o equilíbrio e manutenção das colónias de abelhas.

Foto: António Leitão
As associações de apicultores deveriam reunir-se com os associados e debater este problema, reunindo sugestões. Ao contrário de outros problemas no sector (doenças e pragas), que vamos conseguindo controlar individualmente nos nossos apiários, em relação à perca de colmeias e pastagem para as abelhas provocada pelos incêndios florestais, terá de ser uma acção conjunta, uma acção forte e sólida, pois sem abelhas e pastagem não há futuro para a apicultura.




Uma vez que a apicultura é o parente pobre da agricultura, não será uma tarefa fácil, contudo, se não formos nós próprios a lutar por isso, nunca será possível darmos o nosso contributo para que o sector apícola seja visto como um sector importante para a sociedade em geral.


João Tomé
...um apicultor pela apicultura...